Carlos (segundo da dir. para esq.) atuou em clássico (Foto: Carlos Alberto / Arquivo pessoal)
Apaixonado por futebol, Carlos Alberto bem que tentou fazer carreira como jogador, mas não teve sucesso. Para pagar as contas, começou a trabalhar como coveiro em um cemitério público na zona Norte de Natal. Numa manhã de domingo, durante o expediente, assistindo pela televisão à final do Mundial de Clubes de 2011 entre Santos e Barcelona, não foi a presença de Neymar ou Messi em campo que chamou a atenção dele. O potiguar parou para ouvir os comentários do narrador da partida sobre o trio de arbitragem e decidiu ali, numa salinha apertada da administração do cemitério, que poderia viver o esporte sob um ângulo diferente. Resolveu, então, estudar para ser árbitro de futebol e deixou para trás o trabalho de sepultador, trocando a pá pelo apito. Se formou pela Federação Norte-rio-grandense de Futebol e atua há dois anos na função, de onde tira seu sustento hoje em dia.
Carlos trabalhou quatro anos como coveiro e hoje
é árbitro da FNF (Foto: Klênyo Galvão/GloboEsporte.com)
Não é um trabalho mais tranquilo. A pressão dentro de um campo de
futebol é muito maior. No cemitério, apesar de conviver sempre com a
tristeza dos outros, era mais tranquilo. Mas ser coveiro e juiz tem até
uma certa semelhança. Ali no campo, o juiz é a autoridade máxima. E no
cemitério, o coveiro também é. Tem uma história que falavam antigamente
pelas cidades do interior que a maior autoridade depois do delegado é o
coveiro, porque depois que o coveiro "prende" alguém não tem quem solte.
E na arbitragem, o que o juiz disser está dito - comparou o árbitro,
que atualmente cursa Gestão Desportiva e Lazer no Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN). Aos
28 anos, Carlos mora em uma casa simples com a esposa e um filho
pequeno bem em frente ao portão do cemitério onde trabalhou por quatro
anos no bairro da Redinha, em Natal. Em uma visita ao antigo local de
trabalho, lembranças compartilhadas com ex-companheiros de labuta e
recordações tristes de ter realizado o enterro de um amigo de infância. Entre
um jazigo e outro, caminhando pelo chão de areia, Carlos vai certeiro à
primeira sepultura feita por ele e conta que já participou de pelo
menos mil enterros neste cemitério, que, apesar do ambiente mórbido, tem
uma vista privilegiada para o pôr do sol no Rio Potengi. Ele começou a
trabalhar lá como zelador em 2009 e foi desligado em meados de 2013, já
com o cargo de pedreiro sepultador na carteira de trabalho. Durante
alguns meses, até teve que conciliar as duas atividades. E mesmo
afirmando que se orgulha da antiga profissão, Carlos admite que é nos
gramados que fica mais à vontade. Em um campinho de futebol perto da
casa dele, onde apita uma pelada todas as quintas-feiras à noite, ele
mostra intimidade com a bola fazendo algumas embaixadinhas e revela que
já teve vontade de "enterrar aquele jogador que fica dando trabalho em
campo".VEJA TAMBÉM
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Tem aquele tipo de jogador que dá trabalho mesmo, fica cavando falta, reclamando de tudo, atrasando o jogo, aí dá vontade de enterrar mesmo. Se eu pudesse enterrar, era gaveta nele e tchau. Se um desses chegar para mim perguntando se sou coveiro, eu digo que só ele morrendo para saber - brincou. Desde 2013, ele vem atuando em torneio sub-19 e jogos da segunda divisão do Campeonato Potiguar. Em 2015, Carlos Alberto fez a estreia na primeira divisão, como quarto árbitro da partida entre ABC e Palmeira de Goianinha. Além disso, também esteve em campo no clássico entre Alecrim e América-RN. Foram só seis jogos na elite do futebol potiguar e, para ele, é apenas o começo de uma caminhada que mira um destino bem distante. Meu sonho mesmo é um dia poder apitar um Mundial de Clubes, que foi o que me despertou para ser árbitro de futebol. Quando vejo grandes times como Barcelona, Real Madrid, Bayern de Munique eu olho para a televisão e fico pensando: 'Um dia ainda quero apitar um jogo desses' - almeja. E mesmo sonhando alto na carreira, se engana quem pensa que Carlos gostaria de tirar uma foto com Messi, Cristiano Ronaldo ou Robben. O maior ídolo dele no futebol está no Brasil e joga no Palmeiras. É o Zé Roberto (quem ele gostaria de conhecer). Admiro demais aquele jogador. Aos 41 anos, com o preparo físico dele, a liderança dentro de campo, a disciplina na carreira... Se eu pudesse sentar com algum jogador para bater um papo, tirar uma foto, seria com o Zé - contou, garantindo que não é palmeirense e que prefere não revelar o time do coração.
Por Klênyo GalvãoNatal
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